segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Entrevista a Lídia Ferreira, pescadora na ilha de São Jorge

Lídia Maria Ferreira é uma pescadora da bonita ilha de São Jorge, freguesia da Urzelina.

Ao contrário de algumas mulheres da pesca entrevistadas anteriormente, a sua ligação com o sector piscatória iniciou-se há poucos anos.

Lídia Ferreira anteriormente desempenhava outras tarefas, trabalhava com o marido na carpintaria, mais tarde cortou lenha que era vendida a fábricas e cooperativas. Foi sempre uma grande trabalhadora, mãe e esposa.

O marido de Lídia gostava de pescar e foi daí que surgiu a ideia de irem ao mar, inicialmente praticaram pesca desportiva. Com o passar do tempo tiraram cédula marítima e arranjaram um barco maior “Família Sousa”.

Quanto ao trabalho que desempenha na pesca, Lídia Ferreira para além de ir ao mar, faz aparelhos de pesca, prepara o engodo e a isca e trata da administração do barco.

Lídia tem três filhos e todos eles gostam de ir ao mar. O seu filho mais velho, sempre que é necessário vai pescar com o pai e a mãe, gosta muito de ser pescador e não faz desta actividade uma profissão devido à instabilidade e falta de salários fixos.

Quando questionada sobre discriminação, Lídia refere nunca ter sido alvo, muitas pessoas consideram-na corajosa e aventureira. Lídia menciona um episódio engraçado em que de madrugada antes de ir para o mar, também passa no café, como muitos pescadores homens e isso nunca foi criticado.

Lídia faz parte da Ilhas em Rede, Associação de Mulheres na Pesca nos Açores e segundo ela tem sido uma experiência muito enriquecedora e uma ótima forma de dar visibilidade ao trabalho das mulheres da pesca.

É muito importante que as mulheres se façam representar em encontros e debates, que mostrem o seu interesse em matéria da pesca e mantenham-se informadas acerca de legislação, despachos e portarias.

Entrevista: Joana Medeiros

Foto: Laurinda Sousa

Publicada no Jornal Açoriano Oriental, Página Voz dos Marítimos, 17 de Dezembro de 2011

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

As Mulheres da Pesca e a estratégia de mudança do Inquérito Apreciativo

De visita aos Açores, surgiu a oportunidade de estar em formação com as mulheres da pesca, a convite da UMAR - Açores e em parceria com Descalças, Cooperativa Cultural. Participaram na formação, que decorreu na sede do Sindicato de Pescadores em Rabo de Peixe, elementos da Ilhas em Rede, Associação de Mulheres da Pesca nos Açores bem como elementos da UMAR. Ao todo formámos um grupo de 9 pessoas.

Como objetivo, a oficina de trabalho pretendia potenciar a identificação de recursos internos que possibilitam a mudança no sentido desejado. A metodologia baseou-se em dinâmicas de grupo e entrevistas a pares. Repartido pelas tardes de 6 e 7 de Dezembro, num total de 6 horas de formação, percorreu-se o Ciclo do Processo Apreciativo (Cooperride http://appreciativeinquiry.case.edu/ ; Kelm, http://appreciativeliving.com/about-jackie-kelm/).

O Inquérito Apreciativo é uma estratégia para a mudança, alternativa ao clássico “resolução de problemas”. Consiste no estudo e exploração do que dá vida aos sistemas humanos e no estudo daquilo que já funciona bem. Procura o “melhor do que é” para alcançar os sonhos e as possibilidades do que “poderia ser”.

Baseados no processo AIA - APRECIAR | IMAGINAR | AGIR
Apreciar : levar as presentes a identificar situações em que se sentiram competentes num determinado momento;
Imaginar : Potenciar uma visão comum do que seria o melhor que poderia acontecer àquele grupo e individualmente, no que respeita à sua ocupação;
Agir: Identificar as fases necessárias para se transitar da visão ideal, para o real possível e identificação dos passo que podem ser dados a partir daquele momento.

Depois de serem falados os bons momentos que cada uma identificou nas suas vidas, foram imaginadas as condições ideais para a atividade da pesca – IMAGINAR, onde surgiu:

- “Peixe no mar”; “bom tempo”; “não se magoarem”; “irem e virem de boa saúde”; “ganhar dinheiro para pagar dívidas”.
Estas caraterísticas desejadas surgem em contraponto àquilo que identificaram como ameaçador à vida da sua comunidade:
- “maus critérios na atribuição de licenças de pesca”; “má gestão das quotas de pesca”; “falta de informação científica, perceptível pela comunidade de pescadores”
No AGIR, surgem as sugestões vindas da partilha de ideias, ideais e valores de cada uma das presentes:
· “união, reunir informação”;
· “alicerçar a informação em termos políticos|associativos”;
· “trabalhar com as associações masculinas”;
· “divulgar as coisas que já se sabem”;
· “manter a cabeça fria”;
· “participar nas reuniões e tomar a iniciativa de reunir outras instituições”;
· “escolher temas que atraiam os envolvidos e promoção de workshops breves com informação legislativa”;
· “ir de ilha em ilha”.

Este trabalho foi pontuado com sumos, bolos caseiros/regionais e café…uma delícia a troca das palavras, dos cheiros e dos sabores.
A atividade final - “o naufrágio” – foi a demonstração prática de que cada uma das presentes se envolveu no workshop. Algumas descobriram coisas novas …outras renovaram a crença nas suas forças e qualidades. Todas se sentiram mais próximas.
A esta distância fica-me a importância de se desenvolver mecanismos de defesa e alternativas ecológicas que respeitem a comunidade tradicional, assentes na gestão adequadas das quotas de peixe, onde os lucros suprem as necessidades económicas de todos os envolvidos.


Sugiro duas ideias a serem exploradas: Turismo e Gastronomia.
Turismo: desenvolver atividades que envolvam turistas interessados em ver a pesca artesanal, quer ao vivo e a cores, quer num museu que reúna as alfaias da pesca, como por exemplo: rede de enchelevar, gamelas, ou a diferença entre carapau e chicharro.
Gastronomia: reunir e divulgar receitas típicas da comunidade, seja em forma escrita, seja com atividades de mostras gastronómicas…gostaria de provar peixe cozinhado e temperado à moda de Rabo de Peixe.
Aprendi muito com as presentes e aumentei a minha visão dos recursos para uma vida melhor em comunidade.


Ana Caetano
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segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Ouvindo as Vozes das Comunidades Piscatórias


Inovador na forma e no conteúdo, workshop bilingue juntou à mesma mesa cientistas locais e estrangeiros e homens e mulheres da pesca nos Açores

Incentivar a discussão entre investigadores/as e membros das comunidades piscatórias, foi o grande objectivo da conferência “Explorar a Riqueza das Comunidades Piscatórias ouvindo as sua Vozes” que decorreu entre 21 e 24 de Outubro nas ilhas Terceira e São Miguel.

O carácter inovador da conferência, onde participaram cientistas da Dinamarca, Islândia, Espanha, Reino Unido, Polónia e EUA, começou pela prévia auscultação de pessoas e associações ligadas à pesca nas várias ilhas, sobre os temas mais pertinentes a abordar: Política de Pescas; Valorização e Comercialização de Pescado; Formação e Educação; Monitorização e Gestão de Stocks e Pesca Turismo.

Durante o encontro cada tema foi debatido em mesas redondas, com métodos interativos, em inglês e em português, de forma a incentivar a partilha e o debate de opiniões, e cada grupo contou com o apoio de facilitadores/as, tradutores/as e redactores/as.

Na Terceira os trabalhos dividiram-se entre o Pólo Universitário da Terra Chã, e São Mateus e os/as participantes tiveram oportunidade de se movimentar por entre as mesas e posters contribuindo com a sua experiência e saber para aprofundar os temas em debate.

A PCP foi um dos assuntos que maior interesse e discussão provocou, nomeadamente a questão relacionada com as Quotas Individuais Transferíveis (QIT) e o impacto negativo que a concentração das quotas de pesca em grande companhias pode ter, nomeadamente o desaparecimento de pequenas comunidades costeiras como já se verifica na Dinamarca.

Ao nível das outras temáticas concluiu-se que uma monitorização/gestão de stocks eficiente só é possível estreitando a comunicação entre o nível de gestão europeu com o nível de gestão local, até ao nível das comunidades.

As ideias saídas do painel Educação e Formação apontam no sentido da valorização das comunidades piscatórias, na validação de competências dos seus membros e na importância da integração do mar e da pesca em todo o percurso da educação formal.

No Painel sobre Comercialização e Valorização do Pescado foi evidenciada a necessidade de uma melhor repartição das mais valias do pescado e co-responsabilização de todos/as: melhor tratamento do pescado a bordo; presença de veterinários/as e classificadores/as na lotas e seletividade na aquisição por parte dos/as comerciantes.

Relativamente ao tema pesca turismo e tendo em conta as experiências piloto que actualmente decorrem nos Açores, alertou-se para a importância do desenvolvimento de um estudo profundo e abrangente que aponte directrizes sobre como melhor integrar e desenvolver essa actividade na região.

De salientar ainda o contacto directo dos/as cientistas estrangeiros com a realidade local proporcionado pela visita às comunidades piscatórias de Ribeira Quente e Rabo de Peixe, em São Miguel. Enquanto na primeira visitaram o porto e o estaleiro, em Rabo do Peixe reuniram com mulheres da pesca, membros do núcleo de ilha da Associação Ilhas em Rede, com quem trocaram ideias e preocupações.

O Congresso financiado pela SRCTE, e na sequência do projecto EDUMAR, foi organizado em parceria pelo Grupo de Biodiversidade da Universidade dos Açores, RCE - Açores, UMAR-Açores e Associação para a Defesa do Património Marítimo dos Açores.

Texto e foto: Laurinda Sousa (UMAR-Açores)

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Sectores Marítimos: as mulheres cada vez mais presentes


No imaginário colectivo, o meio profissional marítimo foi durante muito tempo associado a um universo masculino. O papel e o estatuto das mulheres nas actividades marítimas evoluíram consideravelmente ao longo dos últimos 20 anos, em matéria de estatuto jurídico, de acesso ao emprego, mas também de visibilidade. Desde 2009, o projecto FEMMAR da Universidade de Nantes reúne investigadores de diferentes disciplinas para estudar os processos sociológicos, jurídicos, económicos e geo- gráficos relacionados com estas evoluções... e compreender os paradoxos que daí possam resultar.

A Universidade de Nantes, em França (Pays de la Loire), desen- volve numerosas áreas de formação e de investigação especiali- zadas no domínio marítimo. É portanto com toda a naturalidade que uma equipa pluridisciplinar composta por juristas, geógra- fos, sociólogos e economistas decidiu estudar a evolução do papel e do estatuto das mulheres nas actividades marítimas.

O seu projecto de investigação, denominado FEMMAR, foi lançado em 2009 com um financiamento de três anos por parte da região Pays de la Loire. O projecto apresenta igual- mente uma dimensão europeia graças a uma colaboração com universidades inglesas, bascas e galegas.

«O objectivo deste estudo era o de verificar em que medida as coisas evoluíram relativamente à imagem antiquada da mulher de mari- nheiro que espera em casa pelo seu marido viajante, explica Pierrick Olivier, um dos investigadores. Além disso, em alguns sectores marítimos, as mulheres reúnem-se em associações de que apenas se ouve falar em caso de crise. Um tal projecto de investigação permite-lhes exprimirem-se fora dos períodos de crise.»

Um inquérito estatístico

No centro do projecto: um inquérito qualitativo cujo objectivo era o de fazer o balanço sobre o lugar das mulheres no seu meio profissional, dando uma atenção particular aos problemas com

que se debatem e às possíveis soluções. O inquérito foi apoiado por várias associações profissionais e femininas, que difundiram o questionário junto dos seus membros. O inquérito em papel foi complementado por entrevistas individuais.

O estudo permitiu obter 408 respostas analisáveis de mulhe- res entre os 18 e os 78 anos. As respostas vêm maioritaria- mente de França (81 %), sendo as restantes da fachada atlântica da Espanha. Do ponto de vista dos sectores de acti- vidade, a repartição é a seguinte: 33 % das inquiridas trabalham no sector das pescas marítimas, 18 % no ramo conquícola

da aquicultura, 32 % na marinha mercante e 17 % na marinha nacional francesa. Obtiveram-se respostas de mulheres que trabalham noutros sectores marítimos, mas em número dema- siado reduzido para que sejam analisáveis de um ponto de vista estatístico. Dentre as mulheres interrogadas, mais de metade possui um estatuto de trabalhador assalariado (55 %), as restantes são chefes de empresa (16 %) e esposas colabo- radoras (9 %). 20 % são não remuneradas. Mais de um quarto das mulheres inquiridas navegam.

Dentre as que trabalham no sector da pesca, 45 % têm respon- sabilidades na gestão da empresa, 41 % na produção e 22 % na actividade comercial. Apenas 11 % navega.

O inquérito debruçou-se sobre numerosos aspectos da vida profissional dessas mulheres. Apenas nos referiremos a alguns deles.

O primeiro é a sua confiança relativamente à perenidade do seu sector de actividade. A confiança é mais elevada nas mari- nhas mercante e militar e relativamente mais baixa na pesca e conquicultura. Segundo os investigadores da Universidade de Nantes, esta percepção relaciona-se com o estatuto das trabalhadoras: as trabalhadoras da marinha apresentam uma maior confiança no futuro do que as que se ocupam de pequenas empresas geralmente familiares (e frágeis) de pesca e aquicultura. É de sublinhar que, paralelamente a esta conclusão, 9 % das mulheres têm de recorrer a um trabalho complementar (principalmente as do sector da pesca) e 12 % trabalham apenas a tempo parcial.

A maioria das mulheres que trabalha nestes sectores marítimos mostra-se contente com a sua profissão. Mais de metade (54 %) voltaria a fazer a mesma escolha, mas, paradoxalmente, 68 % não aconselharia os filhos a seguir a mesma profissão. Quanto à motivação, é de notar que 23 % das mulheres escolheram

a sua profissão pelo prazer, 17 % pela possibilidade de conciliar a vida familiar e a vida profissional (para a pesca e a conquicul- tura) e 15 % pelos rendimentos.

As relações associativas são muito importantes para as mulhe- res inquiridas, sobretudo em Espanha. A este nível, as diver- gências por sector e por país são bastante significativas. Assim, 65 % das mulheres que trabalham nos sectores da pesca e da conquicultura estimam que o reconhecimento das associa- ções de mulheres é insuficiente. Mas esta média esconde uma grande disparidade entre países, caindo a proporção para 49 % em Espanha e ascendendo a 83 % em França. Na mari- nha, 84 % das mulheres estima que as associações femininas não são suficientemente tidas em consideração.

Outro aspecto importante: o assédio no local de trabalho. As mulheres que se dizem vítimas de assédio representam apenas 5 % das pessoas inquiridas nos sectores da pesca e da conquicultura, mas correspondem a 35 % na marinha. Tal dife- rença explica-se pelas relações hierárquicas, mais presentes na marinha. De uma forma mais alargada, 32 % das mulheres, no conjunto de todos os sectores, declara ter sido sujeita a discri- minações na sua vida profissional pelo facto de pertencer ao género feminino. Outro facto significativo: nos sectores da pesca e da marinha mercante, as pessoas interrogadas quei- xam-se da insuficiência dos equipamentos, nomeadamente sanitários, reservados às mulheres nos barcos.

Por fim, um facto significativo da lenta evolução das mentalida- des, neste sector como noutros: na repartição do trabalho doméstico, este continua a ser maioritariamente atribuído às mulheres, sobretudo nos sectores da pesca e da conquicultura, onde 61% das mulheres declara assegurar mais de três quartos das tarefas domésticas e da educação das crianças. No sector da marinha, esta proporção é de 38 %.

Necessidade de se exprimir

Este projecto de investigação mostrou que o lugar da mulher nos sectores marítimos é de uma importância crescente. A ver- tente jurídica do projecto demonstrou que as regulamentações

nacionais e europeias suprimiram as discriminações legais e que este terreno favorável permitiu uma feminização destes sectores, antigamente dominados pelos homens. Existe actualmente um número crescente de mulheres que são chefes de empresas, oficiais de marinha e capitães de pesca. Estas mulheres têm uma contribuição a dar ao universo do trabalho marítimo e precisam de o exprimir. O projecto FEMMAR tem demonstrado isso mesmo.

Numa recente intervenção no Parlamento Europeu, Maria Damanaki, Comissária Europeia das Pescas e dos Assuntos Marítimos, sublinhou a importância do papel das mulheres no desenvolvimento do sector da pesca e da aquicultura. Insistiu na necessidade de reforçar esse papel, «porque existe uma contradição inaceitável entre, por um lado, o papel que desempenham e a riqueza que criam e, por outro lado, o seu reco- nhecimento social e a sua falta de acesso aos benefícios sociais».

Este projecto acaba de entrar no seu último ano de financia- mento. Na agenda: a realização de um filme de vídeo com base nas entrevistas qualitativas levadas a cabo após o inqué- rito, bem como de uma obra destinada a sublinhar o papel dessas mulheres do mar junto do grande público. Para encerrar o projecto, terá lugar um colóquio internacional em Nantes, a 6 e 7 de Junho próximo, para proceder ao balanço dos resultados do projecto e iniciar um debate entre o(a)s participantes.

Para mais informações: http://femmar.free.fr/

(artigo extraído da revista " A Pesca e a aquicultura na Europa" edição nº 51 de Maio de 2011)

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Ilídia Bettencourt mulher da pesca na ilha Graciosa

Ilídia Bettencourt é uma grande mulher da pesca natural da ilha Graciosa. Em 1993 tirou a cédula marítima e vai ao mar desde esta altura. Tem um barco chamado "Lagosta" e sempre que o tempo permite sai para o mar em busca de sustento.

Ilídia não tinha qualquer ligação com o sector piscatório, pois a sua família vivia da agricultura. Foi quando casou com um pescador que teve conhecimento de uma nova realidade.

Inicialmente remendava redes, preparava a isca e o engodo, depois de alguns anos decidiu tirar a cédula marítima.

Nesta altura Ilídia sentiu-se um pouco discriminada, algumas mulheres criticavam-na por considerarem que ir para o mar era trabalho de homens. Por outro lado, os homens apesar de estranharem eram mais atenciosos e ajudavam no que podiam.

Ilídia Bettencourt tem duas filhas, e ambas estão ligadas à pesca, num sector dito de homens souberam impor a sua vontade seguindo as pegadas da mãe. Uma das filhas tem mesmo cédula marítima e vai para o mar com a mãe sempre que possível.

Apesar das dificuldades que o sector piscatório atravessa Ilídia sempre apoiou a decisão das filhas, segundo ela a crise está instalada em todos os sectores, temos que saber ultrapassá-la. Quem tem barcos deve tentar mantê-los quem não tem não é uma boa altura para investir.

Ilídia Bettencourt é sócia e membro dos corpos sociais da Ilhas em Rede, Associação de Mulheres na Pesca nos Açores. Para ela é muito importante a existência desta associação que trabalha para a visibilidade e reconhecimento do trabalho das mulheres na pesca.

Ilídia refere que as actividades desenvolvidas pela Ilhas em Rede, como por exemplo os encontros, formações, e o Teatro d@ Oprimid@ têm um papel muito importante para o desenvolvimento pessoal e profissional das mulheres na pesca.||

Texto e foto: Joana Medeiros


quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Homens e mulheres da pesca discutem com investigadores os grandes temas para a pesca da Região

Entre 21 e 24 de Outubro membros de comunidades piscatórias açorianas, investigadores regionais e internacionais vindos da Dinamarca, Islândia, Espanha, Grécia, Reino Unido, Escócia e Polónia reunir-se-ão em Angra do Heroísmo e Ponta Delgada no workshop “Explorar a riqueza das comunidades piscatórias ouvindo as suas vozes” uma iniciativa da Universidade dos Açores que tem como objectivo discutir questões fundamentais para o sector das pescas do ponto de vista dos pescadores.

Na sequência do projecto “EDUMAR – Perspectivas sobre o mar” financiado pela Direcção Regional da Ciência e Tecnologia realizado entre 2008 e 2010, e numa colaboração entre o Grupo da Biodiversidade dos Açores, a Associação para a Defesa do Património Marítimo dos Açores e a UMAR Açores foram realizadas entrevistas a membros de associações de pescadores de várias ilhas para auscultar quais as grandes questões que estes gostariam de ver debatidas.

Destes contactos acabariam por ser eleitos 5 grandes temas: (1) a política das pescas, (2) o transporte, marketing e comercialização de pescado de alta qualidade e a necessidade da criação de oportunidades de uma venda mais justa para os pescadores; (3) o acesso à educação e a sua relevância para os jovens que gostariam de ver a prática da sua actividade credenciada; (4) o papel da colaboração entre pescadores e investigadores no estabelecimento de parcerias para a monitorização e gestão de stocks nos parques marinhos (tendo como exemplo o Caneiro dos Meros e o Banco do Condor) e finalmente (5) oportunidades e desafios para pesca tradicional do ponto de vista turístico.

Na sexta-feira dia 21 pelas 9h30 dar-se-á início aos trabalhos que terão lugar no auditório do Campus do Pico da Urze da Universidade dos Açores. Os participantes estarão organizados em mesas redondas para a discussão dos 5 temas em debate. Quem desejar participar, terá que se inscrever previamente para as sessões de sexta-feira (dia 21) no entanto, para as sessões de sábado (dia 22) que terão lugar no Centro Social e Paroquial de São Mateus da Calheta (a partir das 14h), e para as sessões de segunda-feira (dia 24) na Ribeira Quente (pelas 11h30) e em Rabo de Peixe (pelas 15h00) os interessados poderão assistir, sem a necessidade de inscrição prévia, e participar num evento que, de forma inovadora tentará abrir a discussão, tradicionalmente fechada à academia e à decisão política, à participação das comunidades piscatórias “ouvindo as suas vozes”.

Fonte: Comissão Organizadora da Conferência

Foto: Laurinda Sousa

Ângela Rodrigues, mulher da Pesca da ilha do Pico

Ângela Rodrigues é uma mulher da pesca que vive na soberba ilha Montanha, Pico.

É casada com um pescador, e foi desde aí que se ligou de corpo e coração à pesca. Já tiveram trêsbarcos, hoje têmo “Ângela”.

O seu trabalho na pesca foi se intensificando ao longo dos anos. Inicialmente Ângela encarregava-se de tarefas como a limpeza do barco, quando chegava do mar,bem como dacarrinha onde o peixe era vendido. Depois foi se integrando na vida da pesca, começou a vender peixe pelas freguesias, apreparar a isca, o engodo,etc.

Ângela refere também, que àsvezes trata da administração do barco, apesar de ser o seumarido quem o faz regularmente. Quando questionada com o facto de já ter sido discriminada pelo seu trabalho na pesca, Ângela diz que no inicio, alguns homens ficavam surpresos ao ver uma mulher a trabalhar no porto, por exemplo às 5hoo da manhã, mas directamente nunca foi alvo de discriminação.

Acerca das leis da pesca, segundo Ângela, é necessário que hajam para o bom funcionamento do sector piscatório, porém nãodescarta o facto de em alguns casos serem prejudiciais para os/as pescadores/as, devido às especificidades das ilhas dos Açores.

Ângela Rodrigues faz parte da Ilhas em Rede, Associação de Mulheres na Pesca nos Açores, desde 2008, altura em que foi criada a associação. Para ela é um orgulho fazer parte da Ilhas em Rede, é uma forma de dar a conhecer o papel das mulheres na pesca e neste sentido, dar voz a umgrupo muitasvezes invisível e esquecido. Ângela recorda que há uns anos atrás eram muito poucas as mulheres que se faziam representar em debates e reuniões sobre osector piscatório, porém hoje isso está a ser ultrapassado e a Ilhasem Rede tem constituido um forte contributo para tal.

As mulheres hoje participam e interagem.

Texto e foto: Joana Medeiros

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Ilhas em Rede reúne no Pico

A Ilhas em Rede, Associação de Mulheres da Pesca nos Açores, leva a efeito em São Roque na ilha do Pico, entre 15 e 18 de Setembro, um encontro de âmbito regional, no qual se espera participem cerca de duas dezenas de mulheres de diferentes ilhas.

Intercâmbio, debate e reflexão sobre a situação das mulheres na pesca artesanal é motivo deste encontro do qual faz parte ainda a apresentação pública do projecto “Caminhos em Terra e no Mar”, da UMAR-Açores, incluindo os resultados preliminares de um estudo / levantamento sobre receitas de chicharro, a apresentação de uma peça de Teatro Fórum (Teatro do/a Oprimido/a), a exposição de fotografias “Mulheres semeando um outro Mar” e a exibição do documentário “ComPassos de Mudança”.

As actividades mencionadas terão lugar na Biblioteca Pública de São Roque do Pico e serão abertas ao público que assim poderá ficar a conhecer melhor a realidade, ainda para muitos desconhecida, das mulheres da pesca nos Açores. Uma realidade que inclui, entre outras funções, saídas para o mar (pescadoras de mar), preparação em terra das artes de pesca (pescadoras de terra) e o trabalho logístico e administrativo inerente a uma embarcação de pesca, trabalho este desempenhado na maioria das vezes pelas esposas dos pescadores/armadores e que ainda não é suficientemente reconhecido e valorizado.

Para além das actividades já mencionadas, a ocasião será aproveitada pela Ilhas em Rede para a realização de uma Assembleia Geral, onde será apresentado e colocado a votação o Plano de Actividades para 2012.

Este encontro das mulheres da pesca no Pico conta com a parceria da UMAR-Açores, Câmara Municipal de São Roque do Pico e Descalças Cooperativa Cultura. A iniciativa conta ainda com o apoio da Subsecretaria Regional das Pescas, Biblioteca Municipal de São Roque, Câmara Municipal da Madalena do Pico e Pousadas de Juventude dos Açores.

Laurinda Sousa


terça-feira, 6 de setembro de 2011

Entrevista a Fátima Garcia, pescadora da ilha do Faial

Maria de Fátima Garcia é uma mulher da pesca natural da ilha do Faial, é pescadora há já alguns anos. No ano de 2000 tirou a cédula marítima e anos depois arrais de pesca e arrais costeiro.

Fátima Garcia tem 4 filhos/as, nenhum/a está ligado/a à pesca em termos profissionais, apesar de gostarem de ir para o mar. O sustento da sua família provém do suor e da luta constante inerente à vida na pesca, às suas idas e vindas do mar com o seu marido.

Fátima Garcia referiu que inicialmente alguns homens ficavam um pouco duvidosos ao ver que ela ia para o mar mas ela desde o inicio sempre impôs respeito mostrando que tinha capacidade e sabia fazer exactamente as mesmas coisas que os homens.

Quanto à situação do sector piscatório Fátima Garcia sente uma grande tristeza ao ver que o pescado e os/as pescadores/as não estão a ter o devido valor. O peixe é vendido na lota a um preço muito baixo oscilando de uma forma inacreditável.

Relativamente à Ilhas em Rede, associação da qual tem sido Presidente função que passou agora a ser assumida por Maria Lurdes Lopes, Fátima Garcia vê com muito orgulho o crescimento desta associação.

A valorização do trabalho das mulheres na pesca é muito importante: Desde que a associação foi criada que há um maior reconhecimento por parte das autoridades e entidades, e neste sentido, um maior progresso, as mulheres já não ficam na sombra, gostam de mostrar o seu interesse, questões e dúvidas em matérias da pesca.

Segundo Fátima Garcia o facto de a Ilhas em Rede integrar o Conselho Consultivo Regional do Sul (CCR-Sul) é essencial para o conhecimento da realidade da pesca na Europa.

Apesar da distância e das diferenças geográficas existe muito de comum na pesca artesanal em diferentes países, como dificuldades, limitações e progressos.

Texto: Joana Medeiros

Uma noite com os Pescadores

Entre os dias 17 e 18 de Agosto, compartilhei com três amigos uma intensa experiência no mar: quando voltámos a reunir-nos em terra, nenhum de nós encontrava as palavras para descrever a sua emoção. Essas horas permanecem em mim com extraordinária nitidez, bem como os rostos e as vozes daqueles que me permitiram vivê-las. Vi as águas negras ficarem de improviso transparentes e fervilhar de vida, vi um azul tão profundo que eu nem sequer imaginava que pudesse existir: contudo, dessa noite, não foi a indescritível beleza que me tocou mais, mas sim a rara qualidade humana daqueles que, hora após hora, fadiga atrás de fadiga, cada vez me impressionavam mais pela sua serenidade face a um incógnito presente a cada instante…

Foi assim: uma vez completadas as necessárias diligências, Martine e Miguel, Kas e eu saímos em dois barcos de boca aberta pertencentes a armadores de Rabo de Peixe que se encontravam a pescar na costa Sul. Os dois jornalistas franceses partiram de Vila Franca, no ‘Lisboa’, do Mestre José Manuel: à mesma hora, a Kas e eu deixámos Ponta Delgada no ‘Letícia Moniz’ do Mestre Artur Andrade correndo para Poente. A última luz do dia extinguiu-se, o céu e o mar confundiram-se numa única treva. Mestre Artur mandara-nos vestir os coletes de segurança: durante toda a noite os doze homens da ‘companha’ tiveram para connosco uma atitude de grande protecção, e nunca deixaram de nos explicar tudo o que acontecia. O barco, que arrastava um bote com um único homem, parou abruptamente. Uma luz fortíssima incidiu sobre as águas: a sonda revelara a presença de cardumes. Iniciou então uma actividade sem intervalos, cuja complexidade de execução tinha algo de fantástico, juntando à necessária precisão dos movimentos um esforço físico extremo. Era preciso pescar antes que a Lua estivesse alta, pois a luz dos holofotes do bote é, juntamente com o engodo, o que chama à superfície os cardumes. O barco maior, com as luzes apagadas e em alta velocidade, descreve um círculo em volta da zona iluminada, largando assim as redes: é o «enchalavar», ou rede de cerco. Enquanto o bote sai do círculo e recomeça a sua tarefa noutra zona, os homens já recolhem a enorme rede circular: «Vamos embora», encorajam-se mutuamente enquanto puxam, vencendo uma resistência que se adivinha tremenda. Um complicado jogo de cabos permite fechar o cerco por baixo, e a rede volta a acumular-se à popa, pronta para o próximo lançamento. Quando emergem os metros finais, formando uma espécie de saco, uma chuva prateada de peixes cai no barco, e o ciclo recomeça. São imediatamente devolvidos à água muitos exemplares ainda bem vivos: tudo o não é chicharro ou cavala. Nessa noite, que foi boa, atingiu-se o máximo das capturas permitidas: respectivamente 350 e 300 quilos. O valor deste peixe, após várias detracções, será dividido em partes iguais entre os homens: e uma parte igual à deles será a ‘do barco’. Dois problemas fizeram com que a pesca se prolongasse: uma falha nos holofotes do bote, cuja reparação exigiu o transborde de um segundo homem para a minúscula embarcação, e a captura involuntária de uma enorme tartaruga: durante muito tempo os pescadores lutaram para que saísse da rede sem se magoar, e quando o animal ficou novamente livre, o mais jovem gritou-lhe: «Vai com Deus!», enquanto a bordo explodia a alegria de todos. Contei dez cercos, antes do regresso. Os pescadores estavam exaustos, mas mesmo assim, em voz baixa, continuaram a falar connosco. Já de manhã, após a descarga do peixe, regressámos à terra firme: para os homens o descanso mais que necessário, para a Kas e para mim uma despedida difícil e umas memórias que nos acompanharão para sempre.

Texto: Cátia Benedetti

Fotos: Martine Frágoas e Vicent Plana

In: Açoriano Oriental, página “Voz dos Maritimos” – 31 de Agosto de 2011