sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

As Mulheres da Pesca e a estratégia de mudança do Inquérito Apreciativo

De visita aos Açores, surgiu a oportunidade de estar em formação com as mulheres da pesca, a convite da UMAR - Açores e em parceria com Descalças, Cooperativa Cultural. Participaram na formação, que decorreu na sede do Sindicato de Pescadores em Rabo de Peixe, elementos da Ilhas em Rede, Associação de Mulheres da Pesca nos Açores bem como elementos da UMAR. Ao todo formámos um grupo de 9 pessoas.

Como objetivo, a oficina de trabalho pretendia potenciar a identificação de recursos internos que possibilitam a mudança no sentido desejado. A metodologia baseou-se em dinâmicas de grupo e entrevistas a pares. Repartido pelas tardes de 6 e 7 de Dezembro, num total de 6 horas de formação, percorreu-se o Ciclo do Processo Apreciativo (Cooperride http://appreciativeinquiry.case.edu/ ; Kelm, http://appreciativeliving.com/about-jackie-kelm/).

O Inquérito Apreciativo é uma estratégia para a mudança, alternativa ao clássico “resolução de problemas”. Consiste no estudo e exploração do que dá vida aos sistemas humanos e no estudo daquilo que já funciona bem. Procura o “melhor do que é” para alcançar os sonhos e as possibilidades do que “poderia ser”.

Baseados no processo AIA - APRECIAR | IMAGINAR | AGIR
Apreciar : levar as presentes a identificar situações em que se sentiram competentes num determinado momento;
Imaginar : Potenciar uma visão comum do que seria o melhor que poderia acontecer àquele grupo e individualmente, no que respeita à sua ocupação;
Agir: Identificar as fases necessárias para se transitar da visão ideal, para o real possível e identificação dos passo que podem ser dados a partir daquele momento.

Depois de serem falados os bons momentos que cada uma identificou nas suas vidas, foram imaginadas as condições ideais para a atividade da pesca – IMAGINAR, onde surgiu:

- “Peixe no mar”; “bom tempo”; “não se magoarem”; “irem e virem de boa saúde”; “ganhar dinheiro para pagar dívidas”.
Estas caraterísticas desejadas surgem em contraponto àquilo que identificaram como ameaçador à vida da sua comunidade:
- “maus critérios na atribuição de licenças de pesca”; “má gestão das quotas de pesca”; “falta de informação científica, perceptível pela comunidade de pescadores”
No AGIR, surgem as sugestões vindas da partilha de ideias, ideais e valores de cada uma das presentes:
· “união, reunir informação”;
· “alicerçar a informação em termos políticos|associativos”;
· “trabalhar com as associações masculinas”;
· “divulgar as coisas que já se sabem”;
· “manter a cabeça fria”;
· “participar nas reuniões e tomar a iniciativa de reunir outras instituições”;
· “escolher temas que atraiam os envolvidos e promoção de workshops breves com informação legislativa”;
· “ir de ilha em ilha”.

Este trabalho foi pontuado com sumos, bolos caseiros/regionais e café…uma delícia a troca das palavras, dos cheiros e dos sabores.
A atividade final - “o naufrágio” – foi a demonstração prática de que cada uma das presentes se envolveu no workshop. Algumas descobriram coisas novas …outras renovaram a crença nas suas forças e qualidades. Todas se sentiram mais próximas.
A esta distância fica-me a importância de se desenvolver mecanismos de defesa e alternativas ecológicas que respeitem a comunidade tradicional, assentes na gestão adequadas das quotas de peixe, onde os lucros suprem as necessidades económicas de todos os envolvidos.


Sugiro duas ideias a serem exploradas: Turismo e Gastronomia.
Turismo: desenvolver atividades que envolvam turistas interessados em ver a pesca artesanal, quer ao vivo e a cores, quer num museu que reúna as alfaias da pesca, como por exemplo: rede de enchelevar, gamelas, ou a diferença entre carapau e chicharro.
Gastronomia: reunir e divulgar receitas típicas da comunidade, seja em forma escrita, seja com atividades de mostras gastronómicas…gostaria de provar peixe cozinhado e temperado à moda de Rabo de Peixe.
Aprendi muito com as presentes e aumentei a minha visão dos recursos para uma vida melhor em comunidade.


Ana Caetano
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segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Ouvindo as Vozes das Comunidades Piscatórias


Inovador na forma e no conteúdo, workshop bilingue juntou à mesma mesa cientistas locais e estrangeiros e homens e mulheres da pesca nos Açores

Incentivar a discussão entre investigadores/as e membros das comunidades piscatórias, foi o grande objectivo da conferência “Explorar a Riqueza das Comunidades Piscatórias ouvindo as sua Vozes” que decorreu entre 21 e 24 de Outubro nas ilhas Terceira e São Miguel.

O carácter inovador da conferência, onde participaram cientistas da Dinamarca, Islândia, Espanha, Reino Unido, Polónia e EUA, começou pela prévia auscultação de pessoas e associações ligadas à pesca nas várias ilhas, sobre os temas mais pertinentes a abordar: Política de Pescas; Valorização e Comercialização de Pescado; Formação e Educação; Monitorização e Gestão de Stocks e Pesca Turismo.

Durante o encontro cada tema foi debatido em mesas redondas, com métodos interativos, em inglês e em português, de forma a incentivar a partilha e o debate de opiniões, e cada grupo contou com o apoio de facilitadores/as, tradutores/as e redactores/as.

Na Terceira os trabalhos dividiram-se entre o Pólo Universitário da Terra Chã, e São Mateus e os/as participantes tiveram oportunidade de se movimentar por entre as mesas e posters contribuindo com a sua experiência e saber para aprofundar os temas em debate.

A PCP foi um dos assuntos que maior interesse e discussão provocou, nomeadamente a questão relacionada com as Quotas Individuais Transferíveis (QIT) e o impacto negativo que a concentração das quotas de pesca em grande companhias pode ter, nomeadamente o desaparecimento de pequenas comunidades costeiras como já se verifica na Dinamarca.

Ao nível das outras temáticas concluiu-se que uma monitorização/gestão de stocks eficiente só é possível estreitando a comunicação entre o nível de gestão europeu com o nível de gestão local, até ao nível das comunidades.

As ideias saídas do painel Educação e Formação apontam no sentido da valorização das comunidades piscatórias, na validação de competências dos seus membros e na importância da integração do mar e da pesca em todo o percurso da educação formal.

No Painel sobre Comercialização e Valorização do Pescado foi evidenciada a necessidade de uma melhor repartição das mais valias do pescado e co-responsabilização de todos/as: melhor tratamento do pescado a bordo; presença de veterinários/as e classificadores/as na lotas e seletividade na aquisição por parte dos/as comerciantes.

Relativamente ao tema pesca turismo e tendo em conta as experiências piloto que actualmente decorrem nos Açores, alertou-se para a importância do desenvolvimento de um estudo profundo e abrangente que aponte directrizes sobre como melhor integrar e desenvolver essa actividade na região.

De salientar ainda o contacto directo dos/as cientistas estrangeiros com a realidade local proporcionado pela visita às comunidades piscatórias de Ribeira Quente e Rabo de Peixe, em São Miguel. Enquanto na primeira visitaram o porto e o estaleiro, em Rabo do Peixe reuniram com mulheres da pesca, membros do núcleo de ilha da Associação Ilhas em Rede, com quem trocaram ideias e preocupações.

O Congresso financiado pela SRCTE, e na sequência do projecto EDUMAR, foi organizado em parceria pelo Grupo de Biodiversidade da Universidade dos Açores, RCE - Açores, UMAR-Açores e Associação para a Defesa do Património Marítimo dos Açores.

Texto e foto: Laurinda Sousa (UMAR-Açores)